25/09/2023

XXIV Congresso da SBEC. Antiguidade(s): transposições e vertentes

Universidade Federal do Pará

A Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos está retornando às atividades presenciais. A alegria do reencontro com colegas que desenvolvem pesquisas em temas da Antiguidade e, mais especificamente, nos Estudos Clássicos, mescla-se ao prazer de receber o XXIV Congresso da SBEC e III Seminário de Grupos de Pesquisa, no Campus da UFPA, em Belém. É o primeiro Congresso da SBEC no Norte do Brasil, uma região marcada pela precariedade em termos de ensino, pesquisa e extensão na área. A estrutura curricular de nossos cursos de graduação carece de disciplinas dedicadas ao estudo de língua e literatura grega e latina, bem como de aprofundamentos em história e filosofia antigas. Esses estudos exigem um grande espaço de tempo e não deveriam ficar concentradas em apenas um semestre, como ocorre em algumas universidade federais e estaduais da região, com sua ênfase quase exclusiva em campos de estudo e pesquisa locais. Os Estudos Clássicos têm uma função importante no processo de formação dos estudantes em todos os níveis e o descaso com que têm sido tratados apresenta um triste reflexo na mudança estrutural pela qual o Ensino Básico passou recentemente, fazendo com que estudantes cheguem à graduação com lacunas comprometedoras em sua formação. A antiguidade greco-latina é também parte da tradição da região, Carlos Alberto Nunes, tio de Benedito Nunes, fundador do curso de Filosofia da UFPA, criado pela Resolução nº 169, de 22 de junho de junho de 1973, completando neste ano de 2023, 50 anos de sua fundação. Além das traduções da Ilíada e Odisseia de Homero, da Eneida de Virgílio, Carlos Alberto Nunes traduziu o conjunto dos diálogos de Platão, publicados pela editora da UFPA, sob a organização de Benedito Nunes, volumes que podem ser encontrados na Livraria da UFPA, situada no Campus do Guamá, local do evento.
 

O tema do evento, “Antiguidade(s): transposições e vertentes” propõe pensar os Estudos da(s) Antiguidade(s) sob a égide da pluralidade, a partir de dois conceitos básicos: “transposições” e “vertentes”. Trata-se também de uma forma de homenagear a herança linguística deixada por Maria Helena de Moura Neves, além de constituir uma referência simbólica à região que abrigará o XXIV Congresso da SBEC. A noção de transposição (Versetzung) é marcada pela ideia de deslocamento, de um vir de um lugar originário para um outro lugar que o acolhe e dialoga com ele, dando-lhe um novo sentido. Heidegger entende este movimento como um processo em que “[...] nos vemos transpostos-de-volta (zurückversetzt) ao ponto de partida” (GA 1, 1913, p. 183), embora seja impossível voltarmos a um lugar inteiramente distinto do nosso. Goethe pensa o ato de transpor em sentido apropriador, a partir de uma ideia de tradução “paródica”, ou seja, quando se está “em condições de transpor (versetzen) para o estrangeiro, mas só havendo propriamente esforço de se apropriar (anzueignen) do espírito estranho e reapresentá-lo (darzustellen) com nosso espírito próprio” (W 1, 1998, p. 523). Assim sendo, como pensar as "transposições" nos estudos da(s) Antiguidade(s)? Representaria o movimento de transpor a distância entre o pensamento da Antiguidade e o tempo atual? Seria um ato de acolhimento, uma dissociação entre forma e conteúdo, uma busca de fidelidade ao texto e à cultura original? O caráter transdisciplinar dos Estudos Clássicos e sua flexibilização no Brasil, permite o exercício dialógico entre as mais variadas "vertentes" teóricas (linguísticas, literárias, filosóficas, científicas, culturais, artísticas, históricas, antropológicas, arquitetônicas, arqueológicas, geográficas, míticas, religiosas, filológicas etc.), a partir de interpretações de textos e monumentos da cultura antiga em geral, não exclusivamente da cultura chamada "clássica". No contexto amazônico, podemos pensar na ideia de "transposições" dos rios, técnica utilizada desde a antiguidade, ou no prefixo “trans”, que dá sustentação ao nome da rodovia trans-versal, a trans-amazônica, como uma espécie de divisor-de-águas entre os cortes profundos na floresta e o discurso de (des)integração. Ou nas "vertentes" dos rios, que, por analogia, permitem pensar a Antiguidade como objeto de pesquisa das mais variadas abordagens dos estudos da(s) Antiguidade(s).
A identidade visual do evento abre-se para o tom festivo do encontro presencial, assim como para a temática proposta, em sua preocupação com questões contemporâneas, como o modo de realização das pesquisas na atualidade. Propomos um cortejo dionisíaco, que transpõe os rituais propiciatórios ao deus dos transes e dos trânsitos, em suas representações pictóricas gregas antigas, a partir da releitura de Alma-Tadema e Bouguereau, trazendo a proposta de um jovem ilustrador e designer gráfico paraense, Bruno Navegantes, que reúne ainda as noções de transposições e vertentes para trazer o cortejo báquico até a região amazônica.

Link: https://www.congresso2023.classica.org.br/site/capa