01/12/2022

Reabertura do dossiê Nancy.

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Caras colaboradoras e caros colaboradores da ArteFilosofia,

 

Anunciamos a reabertura do dossiê Nancy. Receberemos textos até o dia 31 de janeiro de 2023.

 

“Será que inventamos o céu com o único fim de fazer cair os corpos?” “Chegou o tempo de escrever e de pensar este corpo no afastamento infinito que o faz nosso, que o faz vir a nós de longe, de mais longe que todos os pensamentos: o corpo exposto da população do mundo.” “(Donde esta necessidade, que é por ora inteiramente indecifrável: este corpo exige uma escrita, um pensamento popular).” (NANCY, J.L., Corpus.)[1]

 

Em 23 de agosto do triste e infeliz ano de 2021, pouco depois de completar 81 anos, morreu Jean-Luc Nancy (26/07/1940), filósofo francês, professor emérito da Universidade de Strasbourg (atualmente Université Marc Bloch), autor de obra vasta e heterogênea, composta de mais de 50 livros publicados, que versam tanto sobre vários filósofos como Descartes, Kant, Hegel, Nietzsche, Heidegger, Bataille, Derrida, como desenvolvem seu próprio pensamento. Autor profícuo, de interesses que não pararam de se modificar com o tempo, não há praticamente tema que não tenha sido tratado pela sua reflexão: além dos clássicos, psicanálise, política, arte, literatura, cinema, outros tantos que desdobram seus interesses anteriores descrevendo uma rotação vertiginosa em seu pensamento: a pintura e o retrato, o gozo, a embriaguez, a identidade, a catástrofe, a comunidade e o comunismo, a democracia e a desconstrução do cristianismo, o coronavírus.

Nesse imenso percurso de pensamento gostaríamos de privilegiar um fio condutor que parte da experiência do corpo e leva à experiência do comum. Que a evocação de dados biográficos não surpreenda aos profissionais do campo da filosofia. Afinal os filósofos proverbialmente pareciam entender que a dedicação ao pensamento pressupunha uma ausência de vida exterior. Sugerimos um caminho inverso para abordar o pensamento de Nancy, desde sempre marcado pela interferência da existência, em um pensamento que não cessou de se abrir para o que lhe é exterior. Mencionamos assim dois acontecimentos em sua biografia, que consideramos vetores essenciais do caminho de seu pensamento.

O primeiro, como é do conhecimento de quase todo mundo, em 1990, Nancy foi diagnosticado com uma gravíssima doença cardíaca, que o teria provavelmente levado à morte prematura (aos 50 anos), se não fosse a operação de transplante, ocorrida em 1992 e que prolongou sua vida, para nossa alegria, por mais abençoados e fecundíssimos 28 anos! A experiência foi objeto de um curto relato, O intruso (2000).

É muito provável que essa experiência de radical desapropriação, pela qual seu próprio corpo passou, com a medicina, com a técnica e que lhe concedeu inesperados e produtivos anos de vida, tenha marcado profundamente o seu pensamento. Consideramos esse “pensamento do corpo”,[2] e do “corpo-fora” – do qual Corpus (1992), escrito antes e depois da cirurgia de transplante, constitui talvez uma inflexão essencial – é da maior relevância e atualidade. Na história da Metafísica Ocidental, não há noção mais esquecida e desprezada do que a do corpo.

O segundo vetor talvez seja a sua longa amizade com o filósofo Philippe Lacoue-Labarthe, com quem construiu uma vida, pensamento e docência em comum. Perguntamo-nos se a experiência de escrita em parceria não foi uma das marcas características de sua trajetória. A quatro mãos eles escreveram uma série de livros e desenvolveram projetos em conjunto:  O título da letraL’Absolu Littéraire, O mito nazi, para nomear apenas alguns. Identificamos aí uma das matrizes da experiência de um “com-viver”, de uma “comunidade”. Talvez aí tenha nascido o pensamento do comum, que orientou e continuou a orientar não só um pensar sobre o mundo e seus múltiplos corpos, mas também um perguntar sobre o sentido da própria experiência de pensamento e da relação entre pensamento e ação.

A Revista ARTEFILOSOFIA convida todos/as interessados/as em participar do próximo número (segundo semestre de 2022) em homenagem a Jean-Luc Nancy, a submeterem suas propostas de ensaios, traduções, sobre qualquer um dos inúmeros temas da extensa obra desse filósofo francês que há pouco nos deixou, destaquemos alguns:

- Corpo; Estética; Filosofia; Política; Comunidade; Sentido; Mundo; Democracia; Desconstrução; Amizade; Sublime; Cinema; Artes; Religião. 


ORGANIZADORAS E ORGANIZADOR:

Virginia de Araujo Figueiredo (UFMG)
Márcia Sá Cavalcante Schuback (Södertörn University)
João Camillo Penna (UFRJ)
 

// As submissões devem estar em conformidade com as "condições para submissão", "diretrizes para autores", "padrões de formatação e "padrões bibliográgicos e citações" da revista Artefilosofia que podem ser consultadas na página. No caso de traduções, é necessário autorização da editora que detém os direitos autorais da obra de Nancy. //

 

[1] NANCY, J.L., Corpus. Trad. Tomás Maia. Lisboa: Ed. Veja Passagens, 2000, pp. 8 e 13.

[2] NANCY, J.L. Corpus, op.cit., p. 36.

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